quarta-feira, outubro 24, 2007

Cansaço.

Vamos lá.

Este é só mais um ponto: odeio essa letra que desponta - tem aparência torta, é gorda e grossa, mas se é nela que se deve escrever que seja. Estou cansada de minhas esquisitas manias de viver. E esse é só mais um texto. Sem pretexto. Que fiquemos no vazio, ora essa. É melhor do que ter pressa e escrever coisa qualquer. Não era pra rimar. Coisa mais chata essa de rima... Como se a vida fosse tão bonita quanto uma canção.

Esqueçamos esse ponto. São apenas palavras.

Mas o que fazer aqui se essa página me deprime, se essa letra me incomoda, se a música que escuto me deixa às alturas numa estúpida sensação de voar? Era para as coisas terem sentido? Uma afirmação: ERA para tudo ter sentido!

Coisa idiota essa de viver: comer, trabalhar, estudar, respirar... Tanto faz. E dizem que a vida tem ritmo.



Este não é um desabafo.
É só cansaço.
E falta de calma.

Amanhã é um outro dia.

quarta-feira, julho 04, 2007

Cartas.

Tenho duas faces, dois olhares sobre mim mesma.
Vezes me vejo frágil noutras dura como pedra.
Sou duas em uma e sendo qualquer uma atento a escrever sobre mim.
Um dia minhas cartas serão jogadas ao mar
em garrafas velhas cheirando a cachaça.
Quero reviver em drinques quentes, cujo aço retorna ao paladar.
Quero embriagar-me em memórias de tempos frios.
Cartas a mim, de mim.
E assim o ciclo estará completo,
sou a melhor pessoa a quem posso confessar-me.

sexta-feira, junho 08, 2007

Entre,

Transpirando as palavras
Respirando o bom senso
Rindo sobre coisas à toa
Chorando dores poucas
Morrendo entre quatro paredes
Renascendo e sendo tantas outras...
Muitas numa mesma face
Nenhuma em certos momentos

Mas, acima de tudo, vivendo.

quarta-feira, maio 23, 2007

Revestida em pó...


De maneira (talvez) inconsciente procuro palavras a me declarar de forma a não parecer a menina que aponta o meu rosto ou a mulher que busco encontrar diante de posições inteligentes e sensatas. Hoje não quero poesia. Talvez qualquer música, mas sem rimas ou romances. Quero hoje ser o que (não) sou. Não procuro escrever um texto longo que relate o que sinto, penso ou imagino ser – quero apenas escrever, como algo de uma necessidade tão intensa que me faz parar estagnada diante de uma frase rabiscada em papel pardo de conta a pagar. Se realmente estou revestida em pó não sei, mas aqui estou.

Já escrevi coisas melhores, apesar de não acreditar muito em minhas próprias palavras. Reler um parágrafo é tortura. A vontade que se tem é a de apagar tudo o que se ousou digitar. Não me apoio nesse sentido e que esse pensamento voe a qualquer lugar. HOJE ele não vai ser efetivado. Diante dos sonhos que tive ultimamente em que tudo se resume a sangue, dor ou morte, que seja então contra essa coisa que corrompe a minha vida pacifica. Entendam, meus pensamentos me fazem ser aquilo que não desejo. Em função deles acabo por me jogar fora. Alguns chamam isso de medo. Eles correm com os próprios pés e me matam cada vez que utilizam artifícios que magoam ao meu espirito. Foi assim que descobri que irei morrer de mim.

Escrever é terapêutico. Uso esta ação de movimentar dedos e jogar pensamentos como uma limpeza. Exercício das mãos e frescor da mente esgotada. Cheiraria a eucalipto se eu utilizasse desinfetante. E inventarei um desses produtos para se limpar o cerebelo em um futuro não muito distante - creiam. É nesse lugar que se escondem os meus defeitos. Quanto às qualidades já não sei. Basta dizer que vez ou outra elas se fazem presentes. Às vezes na menina mulher, outras na mulher menina. Algumas vezes numa Manuela que desconheço....

Mas a verdade é que eu cansei. Cansei de mim. Sim, voltei às minhas próprias reticências.


quarta-feira, maio 16, 2007

Ato de limpar.

Um pouco vazio este espaço. Talvez reflexo da dona. Talvez reflexo do tempo. E sujo de teias de aranha e poeira. De casas de ratos e passos e mãos e rabiscos a lápis. Era pra ser uma pintura esta tela. De uma cor amarela. Talvez refletindo a dona. Talvez refletindo o tempo. Quiçá a vida. Porém se desfaz em palavras, vez ou outra simples, vez ou outra sinceras. E agora brilha e cheira feito objeto novo.

Espanado o pó e coletado os papéis - basta reformular o pensamento, mas só na próxima faxina. Agora me bateu a preguiça...

segunda-feira, abril 30, 2007

Os Ratos

- Sinto cheiro de rato.

É um esgoto.
É o esgoto, em meio a algum buraco.
Fede por ser podre
e o é por ser sujo.

- Mas não o vejo!? Não há nada além de lixo.

Está nas ruas, nas esquinas, nos moquifos
é um cheiro de rato, de bicho.

- Não tenho medo.

Não tenha medo.
É só mais um.
Fede de um cheiro pobre.
É uma mistura de sujeiras e mijos.
Mais que um lixo. É limbo.
Jazem esquecidos.

- Conheço outros tantos "ratos" que não fedem.

Sei, estes cheiram a luxo e a brilho.
Se escondem em perfumes caros, em carros caros...
Não fedem, não exalam, não repelem.
São ainda mais ratos,
pobres, podres e lixo.
Mas não no corpo: tudo está escondido.
A sujeira é do espírito.
Já a Faceta? Esta é de bom moço e guarda um alvoroço que grita:

“Eu não sei de nada e nem estou aqui”.

- Entendi. É o que chamam de ilusão de ótica.

Bravo!


domingo, abril 15, 2007

"A Missa"


Veio junto com fogueira, pedido de casamento, desmaio e dores na coluna. Gente quatro horas em pé. Outras tantas, quatro horas sentadas. Sem contar os dorminhocos, talvez sonolentos devido aos vinhos bebericados no decorrer do dia. E todo mundo esperando a missa começar. Ou será terminar? Agora, passado tantas horas, já nem sei. Só sei que excepcionalmente naquele dia me predispus a ir. Ir-me na verdade, porque foram poucos os minutos para que eu desejasse voltar. E voltei: entre o carro, as grades e as conversas afoitas dos grupos lá fora. Não sei, não sei, a ideia de multidão não me comove.

"Todo mundo dançando”. Entre amém(s) e melodias da infância a entrega às recordações foi quase total. Quantas vezes naquele lugar havia dito não? Quantas vezes preferi o fresco de fora ao morno de dentro? E quantas vezes tive que conter meu anseio entre assistir mais uma prece a brincar de ter infância? "Você sabe que uma prece não vai te dizer?”. O quê, o quê? Fale-me o que será? Se vai ser, se foi ou se nesta hora está a ser, a acontecer. Por que quase sempre achei que iria me dizer algo. E que talvez não escutasse devido a minha constante desatenção. E que talvez caíssem dos céus qualquer coisa para me fazer pagar... Se eu já soubesse.... Existem tantas coisas que faria ou deixaria de fazer caso previamente soubesse...

E houve quem não aguentou o sermão de 50 minutos de um padre velho e cansado. Revirou os olhos e desmaiou. Entre recados e Hospital, a missa continuou. Não, não era nenhuma música. Por que a mim não foi permitido escutar música. Nem escrever no celular. “Basta de luzes coloridas, você deve escutar. É Deus”. E eu nem vi Deus ali. Mas vi pessoas. Pessoas que há muito não havia visto. Talvez houvesse um pouquinho de Deus nisso. Só que basta de Deus por hoje, já que a missa terminou e ninguém morreu.


Não perderia por nada.

"Tá todo mundo dançando e eu também quero dançar, todo mundo dançando esperando a missa (terminar)...".

quarta-feira, abril 11, 2007

E a mente pára?

Para que, meu deus?!
Pára nada e se parar nós concerta. Nem que seja com nó.
Por que se mentir fosse ruim ninguém mentia
E se pensar fizesse mal, ninguém pensava.
E vamos nós lá pensar com a mente: "como essa moça mente".
E minto mesmo, com gosto porque posso.
Pra quem não pode: "Que é que eu tenho haver com isso?”.

segunda-feira, abril 09, 2007

Acesso ao Mirante

Mira ante a cegueira, cansaço, dor nos quadros, até mesmo óculos de grau 0,75.
Mira antes porque durante já não é mira sequer mirante.
É qualquer coisa que aconteça agora.
Fim do que se pensou mirar.
Alvo atingido. Ponto.
Mirante. Largo horizonte. Distante. Em instantes.
Mira em todas as direções. Que por sua vez miram O Mirante.
Miradouro incessante em forma de fanzine.
Alternativo. Independente. Experimental.
Complexo de pensamentos. Simples, porém.

Zine-se aO Mirante.

http://omirantezine.blogspot.com/

quarta-feira, abril 04, 2007

E Deus, existe?

Era pra ser mais uma daquelas viagens estrelares, cujo fim é um universo de pensamentos incoerentes que muitas vezes caem em textos tão pouco. Aliado a essa mania, que permeia minha mente em qualquer horário, estava a calma do local, a amplidão do silêncio e os ruídos de pneus e pista. O transito rápido. O transporte vazio. Era apenas mais uma daquelas viagens em “Ribeira/Boca do Rio”, vermelho e fedorento.

Não me estranha a paz. É ela que procuro quando converso com minha cabeça cansada. Mas qualquer ruído, qualquer que seja visto o silêncio, é capaz de me tirar desse alucinado mundo. Foi uma conversa, um papo qualquer, que me levou à maior descoberta de meus poucos 21 anos de vida.

Nem se pode chamar de conversa duas frases trocadas por duas estudantes fardadas que procuravam um local pra se sentar e papear. No fim tudo o que se encontra é o vazio de dois daqueles lugares reservados, o único lado a lado. Do meu lado escutava apenas a troca de palavras já que meus olhos direcionavam à janela parcialmente aberta que mostrava uma Salvador noturna e seu cheiro. Resolvi investigar. Tinha certeza que o ônibus estava vazio. Não podia ser tão louca (se bem que às vezes posso) a ponto de imaginar amplidão de lugares... Confirmada a expectativa dei-me conta que todos os assentos duplos estavam ocupados por uma única pessoa. Todos. Ninguém havia tido a força de vontade, repito força de vontade, de sentar ao lado de alguém, algum rosto desconhecido qualquer. Salvo as duas garotas, que papeavam sobre coisas da vida, todo o resto era silêncio.

Adoro as janelas. Este é um fato. Tanta coisa acontece no mundo lá fora. E tudo tão rápido diante de uma janela de carro... Mas tanta coisa acontece no mundo de dentro, lembrando-me de uma certa discussão tão religiosa a ponto de calar meus ouvidos... E Deus está nisso. Deus está no fato das pessoas preferirem as janelas. Melhor, Deus está no fato das pessoas preferirem a solidão a arriscarem o desconhecido. Porque nem todos estavam na janela. E Deus, se é que ele existe, sabe disso. Então me lembrei o porque da cidade vagar aos poucos. Mais um feriado cristão. Será que Deus sabe disso?

Adoro esses feriados. Seria hipocrisia minha dizer que não. Adoro tanto que comemoro como se fizesse parte de mim. Ainda que coma peixe preferindo carne e queira abrir meu chocolate antes do Domingo. Mas pra mim isso nunca foi Deus. Era só mais uma forma de reunir a família. Morder minha avó. Beijar um monte de gente gostosa varias vezes em vários dias. Rir, conversar, brincar... Quando eu era criança, e todos esses que quero tão bem estavam perto de mim, Deus não existia. Nenhuma criança que se preze acredita no que não pode ver. Só os adultos são capazes disso. As crianças apenas aprendem com os adultos a dizerem que crêem. Sinceramente, ainda não aprendi. E minha mãe ainda teima.

Teve um tempo que me referia apenas à Deusa. Pra mim se existe um Deus deveria existir uma Deusa. E tiro essas conclusões diante da imagem que pintam de Deus. Não é ele bom e justo? Nenhum homem bom e justo seria machista a ponto de afirmar não precisar de uma mulher. Além disso se querem dizer que foi Deus que criou a natureza só poderia ser uma mulher a criar a terra. Vem da mulher a idéia de cria, de fruto, e não dos homens. Fato. Mas nada de Eva nascer da costela de Adão, apesar de aceitar como qualidade essa faceta tão inteligente de Eva de não aceitar afirmativas como verdades. Foi a primeira a contestar Deus. Se não fosse ela, diante dessa idéia de mundo, nunca haveria os questionadores. E eu não estaria aqui questionando a existência divina.

Pois bem, minha tese quanto a Deusa foi quebrada por mim mesma quando tive a certeza de que não acreditava em Deus. O fato é, se não existe esse Deus que tanto falam por que existiria uma Deusa que poucos comentam? Apesar de que quantidade não torna um fato mais ou menos verdadeiro. Simplesmente contradiria tudo o que penso e preferi não acreditar mais na Deusa. Ponto.

Mas alguns podem se perguntar: Por quê ela não acredita em Deus? Simplesmente porque não existem argumentos o bastante para me afirmarem a existência deste. E não precisa ser cientifico não! Sou tudo menos cientista. Mas ao menos fatos, esses são necessários para se provar uma crença. Aliado a isso a existência de milhares, sim milhares, de religiões que acreditam em um mesmo Deus com nome diferente, costumes diferentes, verdades diferentes. E brigam entre sim numa tentativa estúpida de afirmar ser o seu Deus o verdadeiro. Querem mostrar a todos, fazer com que todos vejam a sua verdade universal. E Deus é isso? O que me lembra Guerra Santa, chacina de Mulçumanos, de Judeus... Tudo em nome de Deus. Seria isso a verdade? Será a verdade o que se prega de porta em porta? Será a verdade aquilo que se escreveu há tantos milhares de anos e hoje é tido como verdade acertada? Para mim muito presumível. E esta é a verdade, não há verdades.

Não tenho paciência. Nenhuma. Prefiro não acreditar em Deus e pronto. Vejo a Bíblia como um ótimo livro história. O primeiro a reunir fatos e lendas com aquele quê poético que tanto aprecio . Mas Deus? Deus está tanto nisso quanto está em "Código Da Vinci", ou em poemas de Cecília Meireles. E Jesus, um grande líder. Daqueles contestadores e que dão cara à tapa. A de se admirar, claro. Mas não mais filho de Deus quanto meu pai seria se ele existisse...

Uns dizem que Deus está em todo lugar. Outros apontam apenas um único para se encontrar Deus. Difícil seria eu encontrá-lo no segundo caso. Claustrofobia crônica. Lugares fechados? ECA (boa desculpa, eu sei! =D). E se for o primeiro, espero que ele esteja na vastidão que se apresenta ao meu lado porque se estiver sentado com o cara em minha frente nunca irei vê-lo. Prefiro olhar para a janela...

Dizem que não se deve discutir sobre Deus. Um daqueles assuntos que se assemelham a "bunda, cada um tem a sua". E se Deus existir, e for isso tudo que dizem, ele vai me entender. Aiai, essa idéia de que "felizes são aqueles que crêem sem vê" me parece história para adulto dormir.

domingo, abril 01, 2007

Entre atos.

Um dia primeiro,
Mentindo como o dia dois.
Fingindo como o dia três.
Ou como qualquer dia depois.

Entre mentes ludibriando verdades,
entre verdades enganado mentes,
Seria um dia como abril,
de um outono quente.

E quem vê folhas caindo pressente:
quem sabe no ano que vem,
quem sabe no ano que foi,
quem sabe amanhã ou depois.

Era para ser uma mentira, porém não falsa.
Mas quem engana sempre sabe:
não há de ser verdade nunca,
não há de ser nunca verdade.

E múrmuros e textos inventados
enganam passageiros em mais um roteiro...
Não será o último,
não foi o primeiro...

como existirá terceiros, entre outros. Entre atos.

sexta-feira, março 30, 2007

Vontade.

Sabe aquela vontade, daquelas vontades bem loucas,
de escrever alguma coisa?
Vem assim sorrateira, tentando rimar, faceira,
e se esconde em um véu de tola transparência.
Coça as mãos. Os braços. O cerebelo.
Arrepia cabelos e pêlos.
Pelo menos.

É feito vontade de fazer algo qualquer.
Vai deixando, deixando,
e de repente todos os dias gritam pelo prazer de fazer.
Até que se faça.
E provavelmente se esqueça.
E que se imponha de novo. Vai saber.

Quanto a escrever não se precisa muito tempo.
A vontade já se instala louca.
Vai forçando seu raciocínio lento da manhã,
assolando seu dia feito sol de meio,
e se inunda à noite em torno de luas.
É algo que não se consegue fugir.
E vem assim, meio selvagem, meio doente.
Vomitando o que se tem
explorando o que se não.

É feito amor.

Bem que não queria ser.
Porque é entrega.
É apego.
E essa vontade me manda, feito feitora, eu feito escrava.
E não peço arrego.
Nem quero, ai de mim.

quinta-feira, março 29, 2007

Cantoria,

De repente me imaginei em um outro mundo,
cujas paredes são brisas
e o ar é feito concreto.
Vi-me entre o pé e a estrada,
entre o movimento e o estático.
Sorri, como toda boa garota.
Dentre o diverso sempre surge o complexo.
Mas o oposto? Este é bastante simples.

E sempre tentamos não escrever quando queremos dizer tudo.

terça-feira, março 20, 2007

Sentimentalismo



Tanta coisa para escrever.
Tantas palavras surgem na cabeça desta eterna viajante.
Mas nada é digno, nada é correto, nada encaixa...
E tudo parece fluir:
O fluxo do sangue no corpo,
a pulsação nas veias,
a respiração que dá vida aos pulmões.
- Bravo.
Grita a mente enraivecida.
A oportunidade perfeita para contar segredos
e me fecho em meu casulo quase patético.

Não seria eu se fosse de outra forma.
"Sentimental eu sou"...
E muito discreta.

quarta-feira, fevereiro 21, 2007

Quem era ela?

Personagem 1

Quem ela era?
Ondas batiam na beira d’água acompanhando o ritmo do carnaval. Arrepios nos ventres expostos, nas risadas trôpegas, nos brilhos delirantes se faziam sentir, ouvir e ver. Como um telespectador ela assistia a tudo apática. Vez ou outra arrastava uma concha marinha albina arranhando a sola delicada dos pés. Era em si um personagem muito delicado, basta dizer. E melancólico, daquela melancolia boa e gostosa que nos traz um pouco de gozo à vida. Aqueles que a viam, alheia à música ambiente que inundava a praia, não sabiam caracterizá-la. Estavam tão entretidos com seus próprios suores que uma jovem solitária no breu, entre areias e pedras asfaltada, não ocupariam meros segundos de atenção. Todos bailavam atordoados com a mistura de corpos, esfregando a quentura entre mãos bobas e sorrisos fáceis. Do que vale a vida senão de festa?
Quem ela era?
Dessa vez se perguntou na intranqüilidade do pensamento. Um tanto sarcástico - pensou. Não saber de si mesmo... Já não bastava olhar-se no espelho. As respostas há muito não surgiam com o vento e desatinar a vislumbrar sua vida tornou-se triste. Trágico. Encostou-se na areia úmida confundindo cabelos e pêlos. Fingia-se de anjo gesticulando braços e pernas. Para si adquiriu asas. Ao seu redor trotava um cortejo de risos e festa sobre as luzes de uma avenida alegre. Quisera fosse enterro, raciocinou. Amanhã será, e riu com a boca torta. Trocou risos por lágrimas... Ali eram tantos. Tantos rostos estranhos numa felicidade que tardará a findar. Alguns vindos de tantos cantos, d’outros mundos que sempre ousei imaginar. Um dia, porém. Não mais hoje – falou com a boca seca. Não mais nunca – frisou amargando um pranto frágil. Tocara a ultima vez sua viola encostada no canto do quarto azul. Vira a casa encher dos rostos agora tão familiares. É carnaval, gritaram vozes mais afoitas. Enalteceu-se quando lembraram de sua beleza e orgulhou-se quando elogiaram sua inteligência. Antes a vida se resumisse a esses momentos de música e amor. Se assim fosse, talvez as vozes não a atordoassem freqüentemente, não a jogassem num abismo do qual sempre voltava arranhada, abatida e ferida. Um dia talvez nem dele voltasse e seu corpo seria encontrado inerte entre as brumas. O durante traria tanto sofrimento que enlouqueceria de vez, pensou. À sua frente o oceano serpenteava em ondas selvagens, intranqüilo, inquieto e voraz. Do que vale a vida senão de liberdade?.

Personagem 2

Caminhava apresada. Trocando os pés, tropeçando em chãos, alta e baixa. Entoava bem alto o refrão com a voz um tanto tremula em mais uma de tantas tentativas de encobrir o desespero. Medo era seu segundo nome, um fato muito bem apresentado durante sua infância, adolescência e agora enquanto adulta desgastada pelo tempo. Perdeu-se de todos, sabia. Onde estavam? Onde estariam? Em que direção? Perguntas sem respostas. Devo me controlar para não gritar. Não grite, eu peço. Não grite... Olhou para os lados. Rostos bandidos apenas. O terror havia tomado conta do seu corpo. Era mais uma crise. Mais uma que a levaria para cama por horas ou dias talvez. Questionou a sua ida a tal lugar. Ponderou algumas vezes a lista de razões, desde a visita de amigos até a necessidade de não ficar só. De todo modo venerava o contato físico e sabia disso. Mas não assim, não numa solidão que dá medo. Ver-se sozinha, perdida de todos os rostos amigos, tendo ao seu redor um mundo desconhecido. A aproximação de corpos suspeitos fez sua alma espremer-se no corpo. Analisando o ambiente desceu por uma rua poluída de gente, asas nos pés, coração a mil e correu em direção à praia. Ofegante, as mãos no joelho aliviando o peso nas costas, à sua frente o mar pulsava. Lentamente escorregou e sentiu a areia tocar sua pele. Rezou à Deusa que lhe protegesse. Pediu a Deus. Chorou lágrimas secas, mas hálito convulsivo. Do que vale a vida senão de controle?.

Quem será aquela?, pensou.
Quem será essa?, perguntou-se.


Olharam-se brutas e frágeis. Temidas e aterrorizadas. Menina e mulher. Reconheceram-se pelos olhos apesar de desconhecerem os traços amigos da face. Nunca haviam se visto. E sabiam disso.

Quem será? Tão jovem e tão bela. Perdida em dor e em lágrimas, estará machucada?
Quem será? Tão madura e exótica. Perdida em terror, estará machucada?

Eram estranhas a si, porém reais. A tábua na beira de um precipício. A ultima mão. O ultimo rosto. Um milagre enviado. Um anjo, pensou a jovem. Um pequeno anjo, imaginou a mulher. E observando o céu, o mar, o brilho carnavalesco, deixaram o silêncio de suas vozes as acalentarem...