
Um dia informei aos meus:
- Para onde? – questionaram.
A península Itapagipana, que compõe a IIª região administrativa de Salvador, é formada por 14 bairros entre eles a Ribeira e o Uruguai. Itapagipe significa “pedra que avança para o mar” e para muitos o fato de outrora ser considerada uma ilha deu à comunidade um forte senso de identidade o que faz com que seus moradores migrem dentro de sua própria área, mas dificilmente para outras regiões.
- Vou pro Uruguai. – respondi.
- Como assim? Justo o Uruguai? Com tantos bairros na cidade baixa. Por que não mais próximo da sua casa? A Ribeira é um lugar tão tranqüilo...
Há um clima de interior... O caminhar pela beira da água, as cadeiras em frente às portas das casas, construções baixas e predominantemente antigas, misturadas a monumentos históricos e vistas espetaculares. Em contrapartida também é possível ver a degradação do meio ambiente, péssimas condições de vida, de educação e de saúde.
- Eu vi a casa, gostei da casa. É pequena e arrumada. E tem um fator muito importante: custa pouco. Além do mais é provisório.
- Ainda assim... Não é um bairro seguro. Tem que ter um maior cuidado... E com relação ao ônibus? Onde você vai pegar? Como vai ser...
Foi aí que comecei a ter medo. Depois de um mês inteiro buscando um lugar pra acomodar nossas coisas a fim de terminar a reforma da casa, localizada no tranquilo bairro da Ribeira, é complicado dizer não a um apê recém construído e “barato” ainda que não na melhor localização da minha cidade baixa. Então quando me pediram uma opinião, disse sim. E persisti no sim até que as frases que me trouxeram terror começaram. Nesse ínterim o contrato já estava assinado e os móveis já estavam sendo juntados para a mudança.
- Vai ser uma experiência de vida – disse minha mãe uma tarde.
(Entendi que o melhor era acreditar nela.)
O dia mais difícil foi o do primeiro coletivo. O ponto era longe... Quase tão distante quanto o caminho que faço até a casa do amado – depois de 1 hora e meia de trânsito. Mas eram as pessoas que me davam maior medo. Ou melhor, o desconhecido que me causava medo. Não reconhecia as pessoas. Não reconhecia o lugar. Então, entrar pelas ruelas, passar por pedintes mais necessitados do que possíveis delinqüentes, por faces cuja curiosidade era maior do que qualquer outra coisa me fazia imaginar tudo o que não era. E o andar era rápido.
Não, este não é o melhor lugar. Mas já se tornou a experiência que minha mãe um dia disse..
- Não, eu vou a pé.
Imagem: Leandro Estevam. Passeio à Beira Mar, Dezembro de 2006.
11 comentários:
Sempre quis morar sozinho, acho que essa idéia me persegue desde os 10 anos de idade... Mas, ao mesmo tempo tenho tanto medo dos fatores externos, como bem descreveu essa jovem advogada-escritora! Os temores aumentam quando falamos em "cidade alta", onde a vida é bem mais preocupante. Por essas e por outras é que me identifiquei com o belíssimo texto... Bem escrito, com muitos detalhes interessantes e informativo. Parabéns, vou continuar lendo seus escritos.
qdo leio seus textos, parece q tomo mais consciência do qto somos amigos, de como estamos mto presentes um na vida do outro...n preciso falar q adorei o texto (e q me reconheci em vários diálogos!rs). Sua mudança temporária de casa, me ensinou a ver outros caminhos, a me perder (literalmente) e me achar nas ruas da nossa cidade, cidade q os outros chamam de baixa.
Saudades da minha amiga, saudades do pôr de sol em sua casa na Ribeira... :)
Sabe, eu te conheço mas você não me conhece. Por ora, eu moro no interior, mas daqui há um tempo vou pra Salvador e viver o que você vive. E estou com mais medo do que o medo que você teve.
Espero que dê tudo certo com você.
E principalmente comigo! rs
Muito interessante é a vida diaria das pessoas que compoem este cenário.Curiosos e de vez em quando alheios...
E ainda de forma significativa o maior peso na escolha de uma moradia ainda é o transporte comunitário.De fato é ainda um grande problema.
Adorei o texto.
Seu texto é quase um roadie-movie, desses tipo E sua Mãe Também, q vc logo se encanta pela história, que embora comece em um determinado local, logo passa por diversos outros contando histórias alheias para formar a história dos personagens principais e , consequentemente, a do filme.
Gostei das sutilezas do texto com personagens q quase ñ aparecem, mas q pra quem conhece tornam a história ainda mais divertida, como "nego", "meu sol" entre outras...
Escreva mais, te faz bem e eu adoro ler, embora demore pra comentar.
Nego.
OBS.: gostei do título que vc deu a foto.
Poxa, há muito tempo não venho aqui, mas sempre que venho tenho ótimas surpresas!
Naum gostei nada dessa sua experiência aí, me deixa muito longe de você.
"Espero que o tempo vôe para que você retorne e eu possa te abraçaar..." (quando você for comprar pão xD)
Minha filha sempre me surpreende. Muito bom o seu texto. Claro, coeso, simples, e muito bem escrito. Como disse uma amiga minha ao ler um texto seu que lhe mostrei, um dia espero ver um livro seu publicado.
a gente só compreende qdo passa a pertencer.
e o nosso maior medo, talvez, seja nos reconhecermos no outro.
somos todos humanos. o mundo é inteiro, cada coisa resulta d outra. está tudo conectado. por isso, ñ adianta: sou o outro, o outro me é.
adorei o texto. gostei do ritmo, das imagens. bem suas.
bjo!
Delícia de ler... Um texto "teletransportante"... que são os melhores!
Bjs
Manu,
Sei que você passou aqui anteriormente e não deixou nenhum comentário. Minhas palavras retratam minha vida e o que penso. Nem sei se gostaria que você escrevesse algo mesmo sem me entender.
Conheço uma moça chamada Celeste, em salvador. Ela disse que conhecia uma menina que escrevia muito bem e me indicou seu blog.
Grande abraço,
jô
Hey menina...
Clicando por ai encontrei seu blog !
Bacana seu espaco !
Um beijo
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