sexta-feira, dezembro 11, 2009

Para sua segurança...

9 horas da manhã em Belo Horizonte. Um carro estaciona a meio fio. Passam-se 10 minutos, motorista e passageiro continuam em seu interior. 30 minutos, e nada muda. Do outro lado da rua uma câmera de segurança os filma e diante de tal ação estranha o centro policial mais próximo é contactado. Dois policias abordam o carro. Autuam o casal por atentado violento ao pudor.

11 horas da manhã, Salvador. Um pedinte caminha vagarosamente por uma avenida do caminho das árvores. Em cada prédio que passa um dispositivo captura a sua imagem. A luzinha vermelha pisca a cada passo que dá. Nessa mesma avenida outras pessoas também caminham em sua rotina diária de vida, e, do mesmo modo, são observadas. Por traz de cada um, há aqueles que espreitam.

12 horas da tarde, Rio de Janeiro. Uma turista passeia calmamente com uma máquina fotográfica na mão. É abordada por um grupo de meninos, entre crianças e adolescentes, que furtam o objeto e correm para o outro lado da avenida. Foram filmados por uma câmera de segurança. Em 5 minutos são pegos e a máquina devolvida.

3 horas da tarde, Brasília. O ministro do STF, Gilmar Mendes, tem suas conversas gravadas. O Grampo telefônico alcançou o alto escalão do judiciário e o feitiço se virou contra o feiticeiro. Ou é cedo demais para dizer isso?

Sorriam, vocês estão sendo vigiados.

quinta-feira, janeiro 15, 2009

Um novo ano.

Há tanto tempo não apareço neste espaço. Não exponho em verso ou prosa o que sinto tão dentro. Há tempos não faço uso de palavras bobas ou vãs, que expressem, almejem, um sentido. De fato, há tempos, tanta coisa não faz sentido. À mim tem sido o bastante respirar, sorrir, cantar, conversar pelos cotovelos, ou, simplesmente, olhar, sem a necessidade de proferir qualquer que seja o pensamento que me vem à mente em dias de chuva ou de sol. Em outros tempos os dedos já estariam em convulsão ante a falta do que era vicio. Não o é mais. Meu vicio agora é outro. Consiste em observar o tom da minha respiração, o movimento resultante e a paz que me traz. A cada dia me sinto mais out da vida, de tudo o que entendia por vida. Aos poucos encontro o nirvana.

Um novo ano. Um novo texto, sem qualquer pretexto. E a vida que continua sendo sentida, com ritmo, brilho, melodia e muita, muita poesia.

terça-feira, outubro 07, 2008

Insônia.

Três, quatro, uma semana, um mês. Duas horas no dia, às vezes três. Depende do corpo, depende da necessidade do corpo. São 03h12min da madrugada e nada me leva a descansar. E a vida passa, passa, passa bem devagar. Ontem, quantas horas de inércia? O sono foi real ou simples fruto imaginativo? Eu preciso deitar-deitar-deitar, esfregar todo o corpo no colchão, aprisionar os olhos nas pálpebras, matar os bocejos. Quantas horas? Quantas horas já se passaram desde o último cochilo? Quantas horas desde o último suspiro? É madrugada. É dia, é noite, é hora. Quanto mais a mente irá me impedir de chegar ao alívio?

segunda-feira, setembro 08, 2008

No jornal.

Estava na capa das páginas policiais: Pelourinho e os meninos do crack. A notícia denunciava pequenos delitos cometidos por crianças e adolescentes, no centro histórico, contra os turistas a fim de sustentar o vicio.

Não leio jornais. Na verdade, não me interesso por jornais. Até os acho um tanto quanto mentirosos, e esta não é uma crítica aos profissionais - garanto! Mas acreditei quando li sobre os meninos do pelourinho e sua rua apropriada para o uso do crack, onde compram e se lambuzam sobre as vistas de policiais fardados. Acreditei ainda mais quando a mesma reportagem dizia que um desses policiais, questionadoou como resposta: "É assim todo dia". O raciocínio foi rápido. Afinal o trabalho dele é a segurança pública, trazer segurança à sociedade. E todos nós sabemos que há muito tempo tais meninos, magricelas e sem alguns dentes, não fazem parte desta. A segurança pública não atinge aos excluídos sociais. Isto é um fato. Daí não teria sentido uma atitude de qualquer dos nossos policiais, no sentido de impedir tal uso. Não poderiam. O verdadeiro trabalho da nobre policia, principalmente aquela que passeia pelas ruas do pelourinho, é assegurar que os "gringos" não sejam vitimados. Bem, nem isso conseguem fazer direito.

Eu realmente não leio jornais. Li esse em uma viagem de carro que durariam quatro horas, de forma que seria tempo demais para se admitir a inércia. Li porque a noticia me chamou atenção, já que há poucos dias andava pelas ruelas históricas criticando a monstruosidade que é a prefeitura (tenho ódio toda vez que a vejo, urgh!) e sendo surrupiada por um menininho tão simpático, mas tão simpático, que levou meu sorvete sem qualquer consentimento. Tudo bem, o sorriso dele valia. Mas se a minha intenção tinha sido ver as exposições do "A Gosto da€ Fotografia" no Solar do Ferrão, acabou não sendo somente isso. Vi o que queria ver, é verdade, mas vi ainda mais, algo que talvez o venezuelano e o Sansei/Ninsei/NãoSei também gostariam de presenciar e quem sabe até fotografar. Era o céu mais lindo do mundo, sim era!, em meio a uma paisagem tão colorida e triste. E era lindo justamente por representar isso. A tristeza em suas nuvens densas de chuva, a paz do azul (é uma tranqüilidade que o vento traz naquele lugar) e a esperança pintada de laranja que misturava tudo e transformava em alegria lá no alto e refletia no mundo de baixo com todos os movimentos artísticos e culturais e toda a vida que pulsa e morre naquele centro.

Nessa Sexta estava lendo o jornal. Trazia a noticia dos meninos e sua rua própria para o uso do crack. Talvez nunca tenha visto tal rua. Não tenho vergonha em admitir que me prendo àquelas principais, um pouco por ter pouca curiosidade, um pouco por ter um pouco de insegurança. Mas ao ler pensei que talvez, apenas talvez, os meninos do crack ao fumarem mais um pouquinho, ao se segurarem um pouco mais na própria inexistência, ao surrupiarem mais alguns objetos que seriam trocados, tão logo pudessem, por uma única pedra, tenham olhado, às cinco horas da tarde daquela quarta-feira, para aquele mesmo céu que banhava o pelô e talvez sentido, só um pouco, a esperança que o pintava.



Hannah, estás me ouvindo? Onde te encontrares, levanta os olhos. Vês, Hannah? O sol vai rompendo as nuvens que se dispersam. Estamos saindo da treva para a luz. Vamos entrando num mundo novo - um mundo melhor, em que os homens estarão acima da cobiça, do ódio e da brutalidade. Ergue os olhos, Hannah. A alma do homem ganhou asas e afinal começa a voar. Voa para o arco-íris, para a luz da esperança. Ergue os olhos, Hannah. Ergue os olhos.

O Grande Ditador, discurso final, Charles Chaplin.

sexta-feira, agosto 15, 2008

Aquele velho medo que preenche o corpo. Medo de sofrer. Uma sensação que tolhe os atos que nos faz andar para trás. E os passos são rápidos, acelerados de receios tolos e angústias vãs. Sofrer é um ato de vida. Ser feliz não é a ordem do dia? Daí as resoluções de hoje: fazer o que se quer fazer a quem quiser fazer.

Um dia de certezas incertas, há tempos atrás.

terça-feira, maio 27, 2008

A pedra que avança para o mar...





Um dia informei aos meus:

- Estou de mudança.

- Para onde? – questionaram.

A península Itapagipana, que compõe a IIª região administrativa de Salvador, é formada por 14 bairros entre eles a Ribeira e o Uruguai. Itapagipe significa “pedra que avança para o mar” e para muitos o fato de outrora ser considerada uma ilha deu à comunidade um forte senso de identidade o que faz com que seus moradores migrem dentro de sua própria área, mas dificilmente para outras regiões.

- Vou pro Uruguai. – respondi.

- Como assim? Justo o Uruguai? Com tantos bairros na cidade baixa. Por que não mais próximo da sua casa? A Ribeira é um lugar tão tranqüilo...

Há um clima de interior... O caminhar pela beira da água, as cadeiras em frente às portas das casas, construções baixas e predominantemente antigas, misturadas a monumentos históricos e vistas espetaculares. Em contrapartida também é possível ver a degradação do meio
ambiente, péssimas condições de vida, de educação e de saúde.

- Eu vi a casa, gostei da casa. É pequena e arrumada. E tem um fator muito importante: custa pouco. Além do mais é provisório.

- Ainda assim... Não é um bairro seguro. Tem que ter um maior cuidado... E com relação ao ônibus? Onde você vai pegar? Como vai ser...

Foi aí que comecei a ter medo. Depois de um mês inteiro buscando um lugar
pra acomodar nossas coisas a fim de terminar a reforma da casa, localizada no tranquilo bairro da Ribeira, é complicado dizer não a um apê recém construído e “barato” ainda que não na melhor localização da minha cidade baixa. Então quando me pediram uma opinião, disse sim. E persisti no sim até que as frases que me trouxeram terror começaram. Nesse ínterim o contrato já estava assinado e os móveis já estavam sendo juntados para a mudança.

- Vai ser uma experiência de vida – disse minha mãe uma tarde.

(Entendi que o melhor era acreditar nela.)

O dia mais difícil foi o do primeiro coletivo. O ponto era longe... Quase tão distante
quanto o caminho que faço até a casa do amado – depois de 1 hora e meia de trânsito. Mas eram as pessoas que me davam maior medo. Ou melhor, o desconhecido que me causava medo. Não reconhecia as pessoas. Não reconhecia o lugar. Então, entrar pelas ruelas, passar por pedintes mais necessitados do que possíveis delinqüentes, por faces cuja curiosidade era maior do que qualquer outra coisa me fazia imaginar tudo o que não era. E o andar era rápido.

A primeira volta para casa: 11 horas da noite. Eu e o deserto da rua: cheguei salva.

O primeiro sinal de conhecimento foi a respiração normalizando assim que os pés tocavam a esquina da residência. Dias depois senti a tensão diminuir logo que entrava na primeira rua, próxima à casa. Agora é só chegar na avenida. Passo na locadora de filmes, entre conversa e buscas por outras películas, e retomo meu caminho para casa. Estando fechada, sigo direto sem maiores desesperos. Porém, meu coração ainda acelera quando me vejo muito sozinha.

Os vizinhos são tão noturnos quanto eu. E adoram olhar a vida alheia. Do alto consigo ouvir seus gritos e risos. À noitinha as crianças jogam bola nas ruas e xingam feito adultas que não são - o que me faz lembrar que ensinarei melhor aos meus filhos. São muitos os cães da rua e logo se apaixonaram por meu sol e a seguem noite e dia. E têm aquelas conversas de vizinhos sentados nos passeios, misturados ao lixo e aos ratos.

Não, este não é o melhor lugar. Mas já se tornou a experiência que minha mãe um dia disse..


Hoje fui à casa de uma amiga. Relativamente perto, mas o receio sempre me fez pegar o coletivo (exceto no dia do santo, já contada aqui). Na volta o me perguntaram:

- Ela vai te levar?

- Não, eu vou a pé.

E fui. E cheguei. Sem medos. Descobri que em qualquer ponto desta cidade, a baixa, estarei em meu lugar.


(escrito em fevereiro de 2008)

Imagem: Leandro Estevam. Passeio à Beira Mar, Dezembro de 2006.

sábado, fevereiro 16, 2008

R.O.T.I.N.A


"Sinhô, me disseram preu descansar o corpo,
que corpo cansado não vinga, tá morto,
que o bom é drumir pra mó dispós acordar"



Esqueceram que a vida é rotina,
e geme,
que a carne treme no dia -
que se cansa da monotonia.

E o mundo acorda cansado,
danado e mau-humorado,
e responde com horas contadas
a toda sua filharada

E estes acordam todo dia,
no calor e na agonia,
passam o dia batalhando,
o suor do rosto pingando,


- numa rotina de vida que não deixa sequer a própria parar para respirar.